DE CONTO EM CONTO - UM DEZEMBRO ERRADO

Sentado mais uma vez em sua escrivaninha, tentando escrever algo que prestasse para o jornal de quinta em que trabalhava; a chuva fina e insistente batia na janela, um dia de chuva em um dezembro errado, no qual nada de diferente acontecia e a nostalgia persistia em seus pensamentos. Caminhou pelo cômodo desorganizado como sempre e olhou pelo vidro molhado da janela, o cheiro forte do seu fumo tomou conta do ambiente e ele tragou com vontade.
Ela agora estaria no trabalho, sim, pois ela trabalhava em algo que parecia ser completamente interessante, tudo sobre ela, para ele, parecia ser completamente interessante, certamente ela não estaria pensando nele ou pelo menos foi isso que ele pensou, que ela estaria ocupada tratando de algo muito importante, dando atenção a pessoas demais, com a cabeça tomada pelo dever e responsabilidade que para o gosto dele ela tinha demais, não estaria na janela fumando nem certamente pensando nele. Será que ela ainda pensava nele, será que ela ao menos se importava se ele estaria bem ou não, ele não fazia idéia já que fazia meses que eles não se falavam e nem se viam, a falta que ele sentia dela era enorme e angustiante, mas ele já não se importava mais com isso, pois tentava manter os pensamentos o mais distante possível de tudo relacionado a ela, tudo que tinham passado, mas parecia impossível porque ela era parecida demais com ele em muitos sentidos; tudo que ele gostava lembrava ela, tudo que ele lia lembrava ela, os lugares por onde passava lembravam ela, as pessoas que ele falava lembravam ela, e o simples fato de lembrar dela doía o peito de forma dilacerante, como se fossem arrancar-lhe o coração, ele ainda não tinha esquecido as cicatrizes que ela fez, mas entretanto não conseguia não pensar nela pois o fato de tentar esquecê-la doía mais ainda, dor essa que não podia suportar.
Tentou desanuviar a cabeça, fez um café forte e sentou-se novamente para tentar escrever, a chuva agora estava forte e batia violentamente na janela, o barulho do vento soprava alto no tempo fechado deste dezembro bizarramente frio; tomou um grande gole do café, este veio quente e fel, queimando-lhe os lábios, era disto que ele precisava. Começou as primeiras linhas, escrevendo sem pensar muito sobre qualquer assunto que lhe vinha à mente; mas não conseguia continuar, lia e relia o que tinha escrito sem absorver nenhuma palavra, sem conseguir dar continuidade ao que tinha displicentemente começado; o fantasma dela hoje estava perseguindo-o de forma descontrolada, ele levantou-se caminhando pela sala de um lado para o outro sem saber o que fazer durante um longo tempo, então fez a única coisa que lhe parecia sensata. Pegou o telefone e discou o número que estava entranhado em sua memória, o número que já havia ligado tantas vezes, esperou ansiosamente enquanto o telefone chamava, quando ela atendesse ele diria tudo que precisava ser dito, tudo que estava sentindo, as dúvidas, os medos, os traumas, a paixão incessante que ainda nutria por ela apesar de tudo; o telefone chamava, chamava enquanto suas mãos tremiam, foi quando uma voz roucamente encantadora atendeu a chamada perguntado quem era, ele ouviu sua voz, sua linda voz esperando uma resposta que não veio, desligou por fim.    

Juliana Meneses

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